
O homem de Deus que acendeu fogueiras na noite do Mundo
João Gonçalves (Jurista)
Calcula-se que sejam cerca de 18 milhões, só na Europa, as crianças vítimas de abusos sexuais. Há indícios de que esse número vai crescendo. Com razão se fala em holocausto silenciado e muito ignorado.
Quando recentemente me pediram informações sobre o número de inquéritos atualmente pendentes nos tribunais e relativos a crimes de abuso sexual de jovens e adolescentes, resolvi fazer uma busca na internet. Procedi a tal busca através das palavras “inquéritos” e “abusos sexuais”. Sem exagerar, devo dizer que, talvez, em cada dez notícias ou outro tipo de informações a que tive acesso, nove seriam sobre o número de inquéritos relativos à prática desse crime por sacerdotes ou no âmbito da Igreja Católica. Com alguma dificuldade, lá conseguiu obter o número global que pretendia, relativo ao ano corrente, que era mais de cem vezes superior aos desses outros inquéritos sobre abusos na Igreja Católica, sendo estes relativos a vários anos.
Não quero
com isto diminuir ou atenuar a gravidade da prática desses crimes no âmbito da
Igreja Católica, desde logo porque eles representam uma afronta à ética sexual
cristã e personalista contrária à “coisificação” da pessoa e à mensagem evangélica
que, contra a corrente da cultura antiga, apela ao amor preferencial pelos mais
pequenos e inocentes (sobre estes aspetos ético, com reflexos noutros campos da
sexualidade, também pouco se tem dito). São, assim, um grave contra-testemunho,
para além de representarem uma quebra de confiança depositada nos ministros de
Deus e da Igreja pelas vítimas e seus progenitores.
O que
quero dizer é que desses casos não pode deduzir-se que se trata de um fenómeno
sistémico ou característico da Igreja Católica, capaz de lançar sobre os
sacerdotes uma suspeição generalizada (como já se verificou noutros países e
parece começar a verificar-se também entre nós). Nem pretendo que esses casos
sejam ocultados, como foram durante muito tempo. Deve, porém acautelar-se o
respeito pelo princípio da presunção de inocência (que vale para os sacerdotes
como para qualquer outra pessoa) e o risco de condenar inocentes através da
comunicação social, com consequências irremediáveis.
Mas também
me parece legítimo e justo, apenas por uma questão de fidelidade à verdade, dar
um destaque minimente equiparável (já nem digo igual) ao que é dado a esses
crimes e pecados também ao bem que fazem membros da Igreja Católica em todo o
mundo em prol da infância e da juventude.
Ocorrem-me
imediatamente as notícias que me têm chegado da presença de missionários
católicos em Moçambique, que não abandonam as populações vítimas do terrorismo
e de outras violações dos direitos humanos. Desde logo, as da missão de
Chipene, onde foi assassinada a Irmã Maria di Coppi, religiosa comboniana
italiana. Uma mulher que poderia gozar a sua reforma em lugares mais
tranquilos, que dedicou a sua vida àquele povo sem nada esperar em troca, que
procurou salvar todos os jovens que com ela viviam e que antecipadamente
perdoou (e pediu aos familiares que perdoassem) os seus algozes. Nessa missão,
apesar de toda a destruição provocada pelos ataques terroristas e do medo que
em todos permanece, os trabalhos da escola e do hospital estão agora a ser
retomados, porque não se pensa em abandonar esse povo e esses jovens.
Mas
parece-me de destacar nesta altura, sobretudo, uma ação, de que nunca vi ecos
na comunicação social portuguesa, que tanto se tem interessado pela temática
dos abusos sexuais de crianças e adolescentes. Uma ação dedicada, precisamente,
à defesa das vítimas da pedofilia e da pornografia infantil: a do sacerdote
italiano Fortunato di Noto e da associação Meter (www.associazionemeter.org),
por ele fundada, ação retratada no livro de Roberto Mistreta Don Fortunato do
Noto – La mia battaglia in difesa dei bambini (Paoline, 2021). Não conheço,
mesmo, no âmbito do combate à pornografia infantil uma ação de tão vasto
alcance como esta.
A
associação Meter dedica-se à denúncia de redes de pornografia infantil e de
tráfico de crianças para exploração sexual através de buscas na internet com as
mais sofisticadas técnicas de navegação (as quais permitem o acesso à chamada
deep web, onde se situa a maior parte das provas desses crimes). São aos
milhares as denúncias enviadas anualmente a polícias de todo o mundo, algumas
que levam à libertação de muitas das vítimas, outras que se deparam com
dificuldades de vária ordem (como as relativas à cooperação internacional entre
polícias e autoridades judiciárias) e acabam por não ter seguimento. São na
ordem dos milhões as fotos e vídeos que todos os anos são detetados. Questionado
sobre a coerência evangélica desta ação de denúncia de crimes junto de
entidades policiais por parte de um sacerdote, o Pe. di Noto não tem dúvidas de
que desse modo está a contribuir para a libertação de milhares de vítimas
vulneráveis, indefesas e inocentes (e assim tem sido, efetivamente).
O conteúdo
dessas fotos e vídeos é algo de indescritível e que atinge os limites da maior
perversão (tenho tido ocasião de o confirmar em processos de que tenho tido
conhecimento na minha profissão de juiz). As vítimas podem ser da mais tenra
idade, até recém-nascidas. À exploração sexual muitas vezes se associa o
sadismo e a tortura. Através da internet são trocadas, além das imagens,
informações sobre formas de “compra” de crianças por catálogo. São astronómicos
os montantes monetários envolvidos.
Também
desse modo se difunde a pseudocultura pedófila, a tentativa de normalização e a
apologia das relações pedófilas (a ponto de serem celebradas jornadas de
“orgulho pedófilo”) e o negacionismo dos seus efeitos nocivos. Mensagens desse
teor dirigidas às potencias vítimas (às próprias crianças) também se encontram
nesses sítios da internet.
Ao
contrário do que por vezes se afirma para justificar o livre acesso à
pornografia, o consumo de imagens de pornografia infantil não é um sucedâneo da
efetiva prática de abusos, mas estimula essa prática e com ela está muitas
vezes associado.
Para além
dessa ação de denúncia, a associação Meter dedica-se ao apoio às vítimas de
abusos sexuais de crianças e adolescentes, e suas famílias, tal como a ações de
formação nesse âmbito. A respeito da necessidade desse apoio, é significativo o
que tem afirmado o Pe. di Noto sobre a persistência no tempo dos traumas desses
abusos: uma criança abusada vive presa num corpo de adulto e está aí, a gritar,
na escuridão e com medo, à espera de ser libertada. São duríssimas as palavras
que ele tem usado quando se refere a sacerdotes responsáveis por esses abusos.
Calcula-se
que sejam cerca de dezoito milhões, só na Europa, as crianças vítimas de abusos
sexuais. Há indícios de que esse número vai crescendo. Com razão, fala a este
respeito o Pe. Fortunato di Noto em holocausto silenciado e que muitos ignoram.
Falo deste exemplo como contributo para uma visão mais correta e completa do
fenómeno dos abusos sexuais de crianças e adolescentes, e também da ação da
Igreja neste âmbito.
In Observador, 19/10/2022
João Gonçalves (Jurista)
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José Paulo Abreu, Cón.
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